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domingo, 14 de novembro de 2010

ARS LITTERARIA (28): Conceição Caleiro recebe Prémio Pen Club

C.C. Islands (2010) / (re)designed by David Zink



O CÃO DE CONCEIÇÃO CALEIRO


O romance de estreia de Conceição Caleiro – O Cão das Ilhas. Lisboa: Ed. Sextante, 2009 –, acabou de ser galardoado pelo P.E.N. Clube com o prémio «1.ª obra».

Na verdade, Conceição Caleiro, habitualmente dedicada aos campos do ensaio e da crítica literária informada, e animadora de comunidades de leitores, ousou saltar a barricada da escrita criativa, estreando-se na «arte do romance» (Kundera) e fê-lo com grande eficácia, ora certificada no reconhecimento pelos seus pares e pela atribuição deste prestigioso prémio..

Importa notar que a autora é uma conhecida especialista da obra de Clarisse Lispector (tema da sua tese de mestrado), e últimamente da obra de Maria Gabriela Llansol - donde vislumbramos ecos no título ("amar um cão"), no uso do pronome comum "Maria" e julgamos que no conteúdo - muito embora o sentido do trágico colocado na primeira pessoa na obra das mencionadas autoras em Caleriro seja deslocado para a 3.ª pessoa, o "herói".

A obra em questão fora já merecedora de substantivos artigos críticos – nem todos encomiásticos, é certo – mas, ainda assim, a provar que a mesma não passara despercebida e tinha substância literária suficiente para merecer o esforço da análise e o espaço mediático.

Nomeadamente, Helena Vasconcelos, refere no Público que «"O Cão das Ilhas" é um livro surpreendente e poderoso, uma tragédia clássica, com fontes gregas e shakespereanas, a primeira obra de uma autora que escreve com segurança e mestria. A construção da narrativa, a utilização de uma voz (principal) masculina e de três vozes femininas, a passagem de umas para as outras com agilidade e autoridade, a beleza quase onírica de certas imagens fazem deste livro uma obra excepcional, com ecos do Antigo Testamento, da tragédia grega, de Ovídio e de George Bataille. Caleiro tanto descreve cenas prosaicas como outras de uma enorme intensidade erótica e dramática, conjugando o carácter realista e os aspectos simbólicos com extraordinária habilidade e dando espaço para um realismo cruel aliado a um ritmo poético encantatório. [...] Romance sobre a escravidão feminina física, emocional e moral [...] é, também, uma história sobre a repressão e o medo, sobre o exílio e a solidão, acompanhando o ritmo de Rafael, esse "cão das ilhas", leal, bravio e livre».


Já H.G. Cancela, em "contramundumcritica", embora reconhecendo que se trata de um «texto cuidado e ambicioso» discorrendo que «Nesta perspectiva, Rafael é o herói intemporal, o amante ferido e escorraçado que agrega em si as sementes imparáveis da vingança. Anjo e demónio, para resumir, numa atmosfera que ao seu passar se contamina e, a passo e passo, condensa o germinar da tragédia quase anunciada», entende que se trata de um «Livro de errância» de cuja leitura releva «as passagens assumidamente eróticas e carnais, fulgurantes indícios de um mal-estar, cru e cruel, que acode aos sentimentos contraditórios do protagonista – nas suas relações, dir-se-ia não existirem afectos, antes ímpetos, não a calmaria do sentimento puro, antes a febrilidade do animal em sangue».
(in: http://contramundumcritica.blogspot.com/2009/10/maria-da-conceicao-caleiro-o-cao-das.htm )
No Expresso, Carlos Bessa, distingue que «O desejo é o leitmotiv do romance de estreia de Maria da Conceição Caleiro, polifónico, com páginas de um erotismo raro na literatura portuguesa. Desejo que traz, inevitavelmente, outras pulsões, como as do poder e da morte, que adensam a narrativa e a tornam aliciante. Particularmente a que decorre da acção de Rafael e de Pilar, ambos ilhéus, personagens e narradores, sendo ainda dois dos vértices de um triângulo amoroso e parte de um crime passional (o último capítulo é particularmente brilhante)». Mais conclui o mesmo crítico que «"O Cão das Ilhas" tem o dom de agarrar o leitor e o conduzir, debaixo da toada tensa e vibrátil da escrita, entre São Miguel, Paris e Lisboa, mostrando que qualquer vida é um corolário de vozes, de enigmas e de pulsões, cujo fim raramente é cristalino».
(in: http://aeiou.expresso.pt/critica-de-livros-de-15-a-21-de-agosto=f530391 )

Posto isto, aqui fica o desafio à sua leitura.
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