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domingo, 27 de junho de 2010

ARS LITTERARIA (24): Criança, uma obra em aberto... - uma hora com Saramago, por Clara Castilho

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CRIANÇA – UMA OBRA EM ABERTO


“Uma hora com…. José Saramago”

Só estive com José Saramago uma vez. Estava preparando o II Encontro do Centro Doutor João dos Santos – a que chamámos “Transições - da 1ª infância à adolescência”e se realizou em Junho de 2000 - e quisemos terminar um dos dias de uma forma mais informal, trazendo alguém, só para “conversar”, naquilo a que demos o nome de “Uma hora com…” (ideia que pegou e hoje vejo em muitos congressos e encontros). E alguém pensou no José Saramago. Não me lembro bem porquê. E lá lhe mandei um email… Ele acedeu a vir, acabei por não perceber a razão. Terá conhecido João dos Santos? Eventualmente. Só quis saber onde e a que horas o queríamos. E lá chegou a horas, sentou-se com aquele ar sério, conversou e foi-se embora. A verdade é que a sala estava cheia, num fim de tarde, bem tarde…

A conversa está publicada nas Actas desse Encontro. Dela transcrevo:

«… A verdade é que eu não me preocupo assim tanto com as crianças, por muito chocante que isso possa parecer. Aquilo que me preocupa é o ser humano… A criança é um momento da vida do ser humano. O pinto é um momento da vida da galinha ou do galo, o cachorro é um momento da vida do cão, somos momentos. E além disso, quando é que a criança começa? ….Mas a pessoa é uma só, a criança interessa-me na sua relação com o lugar onde está, com as pessoas com quem vive, de quem é beneficiária, ou de quem é vítima. Essa tendência que passou da criança-mártir à criança-rei, isso é um lugar comum, mas que no fundo corresponde a esta realidade. …. De que crianças estamos a falar? Das desprotegidas…? Há uma altura em que nós não podemos resolver o problema das pessoas, individualmente consideradas, se não dermos uma volta à sociedade em que estamos a viver…. E isto tem uma relação íntima com aquilo que eu disse, quando digo que a criança que eu fui é tão minha hoje, como eu não era dela então, porque eu ainda não tinha crescido. Mas eu conservo essa criança ...».

Quando fui visitar a exposição sobre ele, no Palácio da Ajuda, em Abril de 2008, vi lá um filme, feito a partir de um livro infantil. Mais tarde começou a correr entre emails. Pode ser encontrado no youtube – “a flor mais grande do mundo José Saramago”. Uma outra forma de o recordarmos.
Clara Castilho


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