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sábado, 21 de fevereiro de 2009

ARS LITTERARIA (16): Yes, we can!

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Um discurso considerado inconveniente


Foi com estas palavras que o Macedo, meu colega de trabalho, se despediu:
- O rapaz sai ao pai, imprudente e corajoso! Visita o seu blog e logo verás se tenho ou não razão.
Cheguei a casa e liguei a Internet para ver o referido blog.
Entre outros, no blog havia estes dizeres:
“ …agora que já passou mais dum ano desde que o meu pai morreu, divulgo a reportagem que originou o seu despedimento. Como no original desta reportagem os nomes da respectiva embaixada, embaixador e general têm um traço vermelho por cima dos seus nomes, chamar-lhes-ei simplesmente a embaixada x, o embaixador y e o general z.
Eis o texto da reportagem:

Realizou-se na passada sexta-feira uma conferência de imprensa na embaixada x, tendo o Senhor General z proferido o seguinte discurso:

“ Meus senhores,

Quando a guerra começa, parece uma fera que saiu da jaula. Ou melhor, assemelha-se mais a um carrasco a aplicar a justiça com o seu machado.
À sua passagem, a guerra tudo destrói. E essa destruição, primeiro objectivo duma guerra, inclui naturalmente os chamados danos colaterais.
Logo que todos ou quase todos os objectivos militares são alcançados, a fera recolhe à sua jaula.
Mas não se iludam meus senhores!
Mesmo depois da guerra ter acabado, quem a provocou ainda tem muitos objectivos a atingir.
Desde logo tem de pensar no que vai dizer aos jornalistas na conferência de imprensa. Há que ter a preocupação de salvar a imagem, mas aparecem sempre alguns jornalistas que só gostam de perguntar o que não devem. Essa é uma das razões que justifica que os todos os países amigos ou aliados, tenham cuidado ao atribuem carteiras profissionais a jornalistas…
Depois, temos de nos preparar para a sessão de teatro que se aproxima.
E qual será essa sessão de teatro, perguntarão os senhores jornalistas.
Pois eu vos digo:
Trata-se de justificar, perante as instâncias internacionais, a justeza da guerra que entretanto terminou. O que nem sempre é tarefa fácil!
Diz-nos porém a experiência que, se a negociação diplomática for bem feita, tudo se irá resolver a contento do país vencedor.
Tudo se irá resolver? Ilusão! Tudo não! Nunca se conseguem resolver todos os problemas porque há sempre aqueles milhares, gente anónima, que, ou ficaram sem casa, ou ficaram sem nada, ou ficaram feridos, ou ficaram estropiados. Depois da guerra, como não têm onde cair mortos, vêm-nos sempre chatear.
São precisamente esses a quem nós, eufemisticamente, chamamos os atingidos pelos chamados danos colaterais da guerra.
Mas além dessa gente, ainda nos vêm bater à porta aqueles senhores representantes da Cruz Vermelha, ou ainda outros em nome de outros Organismos, a clamar pelos direitos humanos das vítimas.
O que eles gostam é de pedir dinheiro a quem o tem.
Mas antes de nos pedirem o dinheiro já justificaram esse pedido aos quatro ventos, alegando sempre que os mortos precisam de ser enterrados, que os sobreviventes precisam de ser tratados, que as crianças e as famílias refugiadas precisam de comer todos os dias, etc, etc.
É evidente que os meios de comunicação, que precisam de rentabilizar os seus negócios, não mais nos largam. Também por isso, cada país livre deve procurar ter algum controle sobre a imprensa que tem.
Este após guerra, é, por vezes, a parte da guerra que nos traz mais chatices.
Vejo pela vossa cara, senhores jornalistas, que estão um pouco espantados com a frontalidade das minhas opiniões. Isso só demonstra que tem dificuldade em lidar com a verdade.
A guerra é também isto, meus senhores.
Subitamente o Senhor embaixador y levantou-se da mesa onde tinha estado sentado até esse momento, aproximou-se do Senhor General z e disse ao microfone o seguinte:
- Senhores jornalistas,
Ao contrário das nossas expectativas, o Senhor General z excedeu-se nos seus comentários sobre a guerra, eventualmente devido à combustão eufórica dos vapores liberto pelo excelente vinho que a todos foi servido durante este jantar.
Ao ouvir isto, o Senhor General z levantou-se e em passos rápidos abandonou a sala.
O Senhor embaixador continuou:
- Apelo à descrição e ao profissionalismo dos senhores jornalistas presentes sobre a maneira como devem relatar o que agora aqui se passou.
Desejo também que o jantar tenha sido do vosso agrado e muito boas-noites a todos.”
Sem mais, o jantar terminou e não houve mais nenhum discurso.”
Assim terminava a última reportagem que o meu pai escreveu.
Sei que esta reportagem nunca chegou a ser publicada. Foi por causa dela que o meu pai foi despedido.
Quero declarar a toda a gente que o meu pai era o melhor pai do mundo e que a sua morte se deveu ao desgosto provocado pelo injusto despedimento de que foi vítima.
Em sua homenagem dedico-lhe este meu poema:

Um dia no mundo,
Não mais se ouvirão histórias tristes
De guerras, injustiças e misérias,
Nem se ouvirá alguém dizer
Que para vencer na vida
Teve de espezinhar tudo e todos,
Que para ter os privilégios que tem,
Estão a ser sacrificados outros povos e o próprio povo.
Um dia no mundo
Não mais se imaginará o Paraíso no céu,
Mas saberemos construí-lo na própria Terra,
Nem aceitaremos com resignação
Mentiras cobertas por propagandas tendenciosas.
Um dia,
A consciência de cada um
Será formada por válidos princípios
E todos os habitantes do mundo
Serão considerados seres humanos,
Amados e respeitados em toda a parte.
Um dia,
O mundo será um hino de alegria
E no mundo,
Todos saberão a razão porque cantam.
Um dia o mundo,
Será Amor.

Francisco José Lampreia



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