O medo
Amanhece.
- Não tomar o pequeno-almoço para que o sangue esteja mais puro!
No laboratório de análises, a sala de espera está cheia de gente.
Faz calor.
No rosto de todos lê-se medo e angústia.
A certa altura, a funcionária anuncia: Senhor Francisco.
Sento-me na cadeira e uma enfermeira precipita-se sobre mim.
No dístico da sua bata está escrito: Maria Vampiro.
Quando sorriu, dois dentes assomaram-lhe pelos cantos da boca.
Fecho os olhos e não me lembro de mais nada. Apenas ouço tiros e a bomba a rebentar. Não sei quantos morreram. Só sei que cheira a sangue, se é que o sangue tem cheiro. Na televisão alguém anuncia:
- Comemoram-se hoje cinco anos da invasão do Iraque.
- Comemoram-se? Mas como? Então os crimes também são comemorados?
Depois, sinto a agulha a penetrar-me no braço mas, corajoso, não tremo.
Passados uns momentos, ouço uma voz que parece vir do outro mundo:
- Já pode abrir os olhos e bom-dia.
Saio.
Cá fora o céu está lindo e as pessoas passam apressadas, indiferentes.
Francisco José Lampreia
Sem comentários:
Enviar um comentário